Os perigos da carne
A primeira reportagem do programa trata de denúncia a respeito de um abatedouro clandestino na cidade de Moreno, interior de Pernambuco. No local, a matéria atenta-se à falta de higiene, cuidados, e os requintes de crueldade a quais os animais são submetidos.
Com imagens gravadas por um aparelho celular, os jornalistas chegam ao local do abate e se deparam com uma situação deplorável. Um animal, ainda vivo, agoniza no chão, enquanto cinco pessoas se dedicam a tarefa de abatê-lo. A brutalidade é explícita.
A carne – clandestina – é vendida no mercado da cidade, em locais sujos e sem nenhum sinal de higiene. A vigilância sanitária explica que a fiscalização existe, mas não funciona, e diz que a construção de um frigorífico na cidade não é viável.
A questão é que depois da democratização do consumo da carne, enquanto a oferta cresce, os abatedouros clandestinos se espalham pelo país. É a população que corre riscos diariamente, quando se alimenta de carne da qual não sabe a procedência. Na reportagem, médicos e nutricionistas explicam os riscos de intoxicação e infecção aos quais somos submetidos.
A matéria também mostra uma operação da Agência de Defesa Agropecuária para apreensão de carne clandestina. Pelas estradas mais movimentadas do Nordeste, o alimento atravessa as cidades em veículos irregulares que não tem a menor condição de transportá-los. A carne apreendida seria distribuída para restaurantes, feiras e outros estabelecimentos.
O terceiro assunto abordado pelo Câmera Record é a situação na qual os trabalhadores de frigoríficos se encontram. Na cidade de Rio Verde, em Goiás – onde existem unidades das empresas BR Foods (Perdigão e Sadia) e Marfrig (Seara, Da Granja, Pena Branca, entre outras) -, o programa investiga denúncias sobre o assunto.
Movimentos repetidos 10 horas por dia, 6 dias por semana, durante anos, deixam cicatrizes e lesões no corpo dos funcionários. A reportagem traz exemplos de pessoas que perderam movimentos e sofrem com a dor diariamente. O intervalo obrigatório de 20 minutos durante a jornada de trabalho é ignorado. As empresas não dão nenhum suporte aos empregados, mesmo sabendo dos riscos a qual eles são submetidos.
A situação não é isolada. Em frigoríficos de todo o Brasil o mesmo abandono acontece. Para quem insiste no argumento da geração de empregos para defender a indústria da carne, a reportagem deixa claro a que custo essas vagas são geradas, e como as pessoas que as ocupam são tratadas.
Grandes frigoríficos perseguem médicos que forneçam atestados a funcionários com problemas, e chegam a tentar subornar outros profissionais para que os anulem. Enquanto cidadãos “idolatram” o grande frigorífico da cidade, que teria trazido desenvolvimento à região, outros sofrem as consequências do descaso e do abuso a qual são submetidos.
O próximo tema é o consumo de carne à céu aberto nas ruas da cidade. A reportagem leva amostras do alimento a um laboratório, onde uma série de exames revela que no famoso “churrasquinho grego”, a quantidade de bactérias e coliformes focais é elevada, levando-o a ser considerado um alimento de risco.
Marcelo Rezende encerra o programa com um discurso de indignação à situação deplorável a qual a população é submetida. O quilo da carne é caro e os impostos são altos, e mesmo que paguemos por isso, a falta de fiscalização é eminente e a indústria da carne produz problemas que vão da ordem de saúde à ordem social.
Apesar de algumas recentes reportagens sobre o universo vegetariano, ainda é extremamente difícil ver iniciativas da mídia que denunciem a indústria da pecuária. Por questões políticas e econômicas, a maioria dos veículos prefere não se impor e não incentivar à população a diminuir o consumo da carne, mesmo que ele seja cada vez mais necessário por diversas razões.
É importante frisar que se a reportagem começa mostrando denúncias a abatedouros clandestinos, ela traz ao seu decorrer importantes acusações à grandes e famosos frigoríficos. Se alguém ainda usa como tese de defesa o argumento de que crueldade e irregularidades só existem em pequenos locais de abate, a reportagem mostra o quanto isso não tem fundamento.
O Ministério da Agricultura, Pecuária e Distribuição mantém o SIF (Sistema de Inspeção Federal), e toda a carne produzida de abatedouros e frigoríficos legais deve conter o selo do órgão, mas o Câmera Record do último domingo deixa claro que nos bastidores, a história é outra.
Brutalidade, falta de fiscalização, e péssimas condições de higiene e de trabalho não são situações exclusivas à clandestinidade. O dinheiro que você gasta todo dia comprando carne – seja ela da marca que for – ajuda a financiar todas essas barbaridades.
Já passou da hora de nos “desaliernarmos” e entendermos de uma vez por todas que por trás do bife que se come no almoço, há vidas – animais e humanas – sendo sacrificadas.
Será que o luxo vale a pena?
A reportagem inteira você assiste aqui:
Os perigos da carne
Reviewed by Jhonatan Galante
on
15:58
Rating:
Nenhum comentário